Ilustríssimos Presidentes da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina:
Aloysio Achutti, Nelson Pires Ferreira, Carlos Gottschall, Luiz Rohde, José Camargo, Luiz Fernando Jobim, Gilberto Schwartsmann, Luiz Lavinsky.
Colegas membros desta Academia
Autoridades em representação de instituições parceiras, citados anteriormente
Convidados
Amigos
Senhoras e senhores
Ao longo de muitos anos, por necessidade de trabalho, me habituei a escrever discursos. Hoje, no entanto, enfrento uma situação distinta. Dois grandes desafios pairam no horizonte. O primeiro, no horizonte desta sala.
Compõem esta Academia uma elite médica. São médicos dedicados à assistência, a laboratórios e bancadas, à pesquisa, ao ensino, a políticas públicas de saúde, à administração. Todos de excelência reconhecida em seu nicho. Não bastasse, muitos dedicam-se em paralelo à literatura, à história, às artes, e sobressaem também nessas áreas, donos que são de múltiplos talentos, e alimentados por um patamar cultural sólido. Tolo seria quem não temesse o olhar e o ouvido crítico desta plateia.
O segundo desafio, são as transformações globais neste primeiro quarto de século dos anos 2000.
Inicio pelas transformações sociais. No discurso de posse do Acadêmico Antonio Mascia Gottschall na Academia Nacional de Medicina, consta o seguinte (entre aspas) “Nos dias atuais, assistimos entre atônitos e impotentes à rara desintegração social e política, num quadro em que a falência de valores morais e éticos fomenta uma corrupção aberta no governo e na sociedade, ouvindo-se de intelectuais improvisados o elogio da ignorância”. Isto foi em 2006. Dezessete anos passados, o quadro não só permanece, como agravou.
Os velhos dogmas da ciclicidade de comportamentos e de modismos ao longo do tempo parecem esmorecer frente ao crescimento constante de aberrações nas redes sociais. O relacionamento interpessoal se tornou mais complicado, superficial, várias vezes agressivo. E não só as redes, outros novos componentes estão perturbando a convivência. Um deles, é a judicialização, que conhecemos no ambiente médico, e que se esparramou de tal modo, que atinge hoje palavras descontextualizadas e pretensos assédios, quer verticais ou horizontais. O politicamente correto, de um caráter inicialmente educativo, tomou rumos inesperados.
Outro ponto, são as múltiplas novidades que pairam sobre nós. Em específico em relação à Medicina, uma edição especial recente da TIME, intitulada The future of Medicine, lista progressos recentes: parece que, enfim, aproxima-se a vacina contra a malária; há o inesperado efeito da semaglutida na obesidade; avançam estudos sobre a relação entre sono e demência e sobre a microbiota intestinal e Alzheimer; surge a possibilidade terapêutica da psilocibina, de um fungo psicodélico, na depressão; criou-se a primeira quimera embriônica com células de homem e macaco; surpreendeu o transplante de medula óssea como cura para HIV; trabalha-se a prevenção da dengue através da infecção do mosquito por outro patógeno.
Mas, para além desses progressos, estamos frente à telemedicina, com seus prós e contras, os bioeletrônicos e a Inteligência Artificial.
Na Medicina, a inteligência artificial pode ser aplicada em várias áreas, como o manejo de dados médicos, imprimindo velocidade à leitura; diagnóstico, como o uso do estetoscópio alimentado por dados da IA; o desenvolvimento de drogas com moléculas de baixo peso molecular; os tratamentos.
Para além da Medicina, são múltiplas as áreas de uso da inteligência artificial. O chatGPT atingiu, passados dois meses de seu lançamento no final de 2022, 100 milhões de usuários, número conquistado em tempo muito menor que o visto com outras plataformas. Hoje, já há escola em Porto Alegre, com disciplina baseada no uso do chatGPT. Saliente-se que ele é considerado uma versão inofensiva da inteligência artificial e que os sistemas disponíveis atualmente são bons.
Um artigo da Folha de São Paulo do último 19 de maio trata dos impactos práticos para a pesquisa acadêmica no âmbito da inteligência artificial. Várias plataformas digitais, a maior parte das quais nem conhecemos, mudam a busca e seleção de artigos, a leitura, a análise e a apresentação dos dados, tudo representando quebra de paradigmas na pesquisa acadêmica para os próximos anos.
Há, no mínimo, dois aspectos que preocupam na inteligência artificial. O mais simples é que é um sistema dados-dependente. Qual a qualidade dos dados inseridos? Quem controla?
Mas o que realmente assusta é a inteligência artificial generativa, com a possibilidade de substituição do trabalho criativo pelas máquinas (nada que a literatura de ficção já não tenha explorado) e a consequente perda de milhões de empregos. A era da inteligência artificial mal começa e já foi divulgada, no último mês de abril, a chamada “Carta de Harvard”, com a assinatura de mais de 1000 pesquisadores e especialistas em tecnologia da informação, que querem diminuir a velocidade do avanço da inteligência artificial, clamando por uma parada de seis meses nas pesquisas sobre sistemas avançados que, segundo eles, configuram grandes riscos para a humanidade. Desde então, não há articulista que não escreva sobre tais possíveis riscos.
Rosa Montero, a escritora e jornalista espanhola, primeira palestrante do Fronteiras do Pensamento deste ano, diz que vivemos um momento desafiador em todos os aspectos da vida e da sociedade. E nós, acompanhamos um tanto aparvalhados, confusos e intimidados, as novidades que pipocam.
Neste contexto, assumo a presidência da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina.
O compromisso social da Academia é expor à sociedade nossa prática em ciência, ética, dedicação profissional e produção intelectual. Mas, no meu olhar, a ser completado pelo olhar de vocês, temos que nos agarrar, com força, no que considero o âmago da Academia: primeiro, sermos modelos de homens e mulheres, e modelos de médicos, com foco na honestidade e ética; segundo, zelarmos pela memória da Medicina no Rio Grande do Sul, porque nós vamos, a Academia fica.
Dizem que ser antecedido por uma boa gestão é um complicador comparativo para um novo gestor. Não vejo assim. Vejo que precisamos agradecer pelo trabalho feito, consolidá-lo e investir em novos objetivos. Agradeço por todos nós à dedicação e conquistas capitaneadas pelo Acadêmico Luiz Lavinsky.
Comporão comigo a nova equipe diretiva, em seus cargos regimentais, os vice-presidentes eleitos pelos senhores, Acadêmicos Sérgio de Paula Ramos e Darcy Ribeiro Pinto Filho; como primeiro secretário, o Acadêmico Jefferson Piva; como segundo secretário, o Acadêmico José Miguel Chatkin e, como tesoureiro, o Acadêmico Jorge Milton Neumann.
Estão confirmados nas Diretorias Setoriais os nomes dos acadêmicos Flávio Kapczinski, Rogério Sarmento Leite, Claudio Marroni, Germano Bonow, Paulo Belmonte de Abreu, Rogério Gastal Xavier, Paulo Roberto Prates. A todos os colegas que emprestarão seus nomes, prestígio e dedicação à Direção, um agradecimento especial.
Em breve serão divulgados os objetivos primários da gestão.
Conclamo todos os membros a participarem da vida da ASRM, e lembro o ouvido de um colega acadêmico: nenhum de nós está aqui pelo que fez, mas pelo potencial já evidenciado do que poderemos fazer.
Finalizo, lembrando que a Academia, ao par do protagonismo no atendimento à sociedade, também existe como reunião de amigos e para momentos de bem-viver.
Muito obrigada e um abraço a todos!