Anotações extraídas de uma carta resposta de Carlos Wallau, em 09 de julho de 1917, ao amigo Dr. Simch, que lhe pedira dados biográficos:
Carlos Wallau nasceu a 28 de julho de 1860, conforme certidão de batismo, na então cidade de Brooklin, no Estado de Nova York, USA, que, em 1917, era apenas um distrito da capital.
Da certidão, consta o nome Frederik, Augustus, Charles de Wallau. No entanto, a ideia de que, “na prática, título sem os devidos meios nada vale” impôs a retirada do “de”, ou seja, o original nome alemão “du” (do francês). Mais tarde, pessoalmente, desistiu do nome pomposo, passando a intitular-se apenas Carlos Wallau, nome ratificado com o advento da República, ao ser naturalizado brasileiro.
Filho de imigrantes das margens do Rheno, possuía dados de família desde 1703. As andanças de Napoleão I dividiram os antepassados, temporária ou definitivamente, ora em alemães, ora em franceses. O avô seguiu ao Corsário, conquistando a “Hespanha”. Teve contudo de voltar para casa a pé. O pai iniciara-se, em Bonn, com vistas ao curso de Medicina, frustrando-se ao ter que assumir os negócios do avô,falecido no Rheno quando ainda contava as façanhas da guerra. Envolvendo-se na política, em favor de ideias democráticas, o pai já estabelecido, temendo represália e prisão, resolveu, igualmente a outros correligionários, emigrar para a “América”. Chegaram apenas com pessoas salvas do naufrágio ocorrido já na costa atlântica de cá, em 1854. A seguir, o pai prosperou de imediato, mas, em 1862, acometido de doença grave, tentou cura voltando à AlemaCarlos e as filhas mulheres, recebeu aconselhamento e empreendeu a terceira viagem, desta vez destinada a Porto Alegre, onde, após cem dias, aportaram em 02/11/1864. “Realmente já com a idade de dez anos, havia em mim o firme propósito íntimo de escolher a carreira de médico” (o segredo ficou documentado num escrito, escondido atrás de uma porta de seu quarto).
À revelia da mãe e das duas irmãs restantes, conseguiu o desiderato. Iniciou os estudos primários aos sete anos, orientado pelo tio, Clemente Wallau; iniciou-se também no alemão e na música. Educado em meio a mulheres, aprendeu a costurar “trabalhos que me proporcionaram certa habilidade manual, em proveito das operações delicadas e plásticas”. Não descurou da ginástica para reverter aniquilamentos das moléstias de infância, sobretudo a escarlatina.
Em 1874, passou a fazer parte como interno do colégio jesuíta, Na. Sra da Conceição. Em 1876, já visando ao acesso à medicina, matriculou-se no Colégio Gomes, depois substituído pelo Souza Lobo. Conviveu então com os amigos Júlio de Castilhos, Assis Brasil, Homero Baptista, Aureliano Barbosa, Ernesto Alves, Ildefonso Pires de Moraes Castro e outros.
Em 1880, matriculou-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, ouvindo os mestres, cujos nomes “ainda hoje são respeitados”: Martins Teixeira, Domingos Freire, Saboia, Benício, Bulhões, Feijó, Torres Homem, Souza Lima e outros. “Fui estudante de notas mais ‘plenas’ do que ‘simplesmente’, e sem distinções maiores. Desejava os conhecimentos necessários para a vida prática”. Em 1885, formou-se com a tese sobre “medicação anestésica” na cadeira de Therapêutica.
Em 1886, visitou Porto Alegre, as irmãs, e a seguir buscou aperfeiçoamento na Europa. Em fins de junho, desembarcava na Antuérpia, com vistas a Berlim, Viena, Londres e Paris.
Assistiu, assim:
• em Berlim, Bergmann – cirurgia; Schroeder – ginecologia e obstetrícia;
• em Viena, Billroth – cirurgia, Braun – ginecologia e obstetrícia; em Londres, Lister – cirurgia, Thomson – vias urinárias;
• em Paris, Pían, Tilleaux, Lucas Chamjoniere e A. Ricard. Em outros cursos, buscou a bacteriologia e laringoscopia, além de medicina interna.
Em 1887, o dr. Wallau retornava a Porto Alegre, iniciando sua vida clínica, praticando intervenções de “alta cirugia” que já lhe garantiram renome. Em 1890, foi nomeado diretor da 4a Seção de Cirurgia da Santa Casa, onde trabalhou por vinte e sete anos. Ainda em 1890, designado pela bancada rio-grandense, foi a Berlim estudar a descoberta do prof. Koch, a cura da tuberculose pela tuberculina.
Encerra a missiva solicitando a devolução do original, a fim de “meus filhos mais tarde possuírem um documento sobre a vida de seu pai” assinando-se “simplesmente amigo e collega, C. Wallau”.
Carlos Wallau foi pai de Hubert Wallau, que foi genro de Moyses de Menezes, que foi também sogro de Bruno Atilio Marsiaj.
Ao ser fundada a Faculdade de Medicina de Porto Alegre, o Dr. Wallau aceitou o convite para lecionar na cadeira de operações e aparelhos. Vagando mais tarde a segunda cadeira de clínica, foi nomeado para regê-la e logo após transferido para a primeira cadeira. Posteriormente, tornou-se professor catedrático de clínica cirúrgica.
Foi diretor eleito da Faculdade, de 1912 a 1913, tendo sido, na sua gestão, iniciadas as obras do prédio da Sarmento Leite. Médico, professor, pesquisador e administrador da Faculdade de Medicina, Carlos Wallau imprimiu à sua biografia os traços de um lutador, de um homem que venceu desafios em épocas difíceis. Carlos Wallau faleceu a 6 de abril de 1918, com apenas 58 anos.