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Cadeira 37

João Carlos Gomes da Silveira

João Gomes da Silveira nasceu em Cruz Alta, no dia 16 de abril de 1913, filho de Dario Silveira, engenheiro-agrônomo, e de Cândida Gomes da Silveira, descendendo dos mais antigos troncos açorianos que povoaram o Estado. Aos quatro anos de idade, já alfabetizado, ingressou no Ginásio Santa Maria, dos irmãos maristas, onde fez os estudos primários e secundários. Ingressou na Faculdade de Medicina de Porto Alegre em 1930. Durante a vida acadêmica foi interno da Enfermaria 6, de cirurgia geral de homens (Dr. Sarmento Leite), e da Enfermaria 3, de cirurgia ginecológica (Dr. Pedro Chaves). Formou-se em 1935, ano do centenário da Revolução Farroupilha, e quando a festa de formatura ocorreu em 20 de setembro. Formado, seguiu para o Rio de Janeiro, para especialização em ginecologia. Lá, tornou-se médico assistente do Serviço de Ginecologia e Cirurgia Geral de Mulheres da Santa Casa de Misericórdia. Ao voltar, foi trabalhar no povoado de Ana Rech, atendendo, também localidades próximas, como Vila Seca e Fazenda Souza, sempre fazendo clínica e cirurgia geral. Numa época heroica da cirurgia, passou a trabalhar em Caxias do Sul, enquanto já preparava sua tese sobre endometriomas de ovário.

Em 1938 fez concurso de títulos, provas e defesa de tese para livre docência de ginecologia na Faculdade de Medicina de Porto Alegre, sendo aprovado. A 2 de março de 1939, tomou posse como assistente de ensino, na cadeira de ginecologia da Faculdade de Medicina que tinha como catedrático o Prof. Martim Gomes. Suas atividades didáticas aconteceram no Ambulatório de Ginecologia da Santa Casa e na Enfermaria 22, de Cirurgia Ginecológica. Coordenou numerosos cursos de aperfeiçoamento para médicos. Em 1955, foi aprovado em primeiro lugar para cátedra de ginecologia da Faculdade de Medicina da UFRGS. Assumiu a cátedra, mas, em agosto de 1955, solicitou demissão de suas funções na Universidade em repúdio a atitudes tomadas pela direção da Faculdade de Medicina e para “preservar a dignidade docente”. Foi o primeiro professor titular de ginecologia da atual Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre e o primeiro professor titular de ginecologia da Faculdade de Medicina da PUC. Na área de saúde pública, foi Chefe do Departamento de Câncer Ginecológico do Centro Regional de Cancerologia da Secretaria da Saúde.

Das atividades na Enfermaria 11e no Ambulatório 8, da Santa Casa, nasceu o livro “Princípios de Ginecologia”. Em 1979 e em 1982 publicou as duas séries de “Curso de cancerologia aplicada à Ginecologia”. Colaborador de todas as edições do tratado “Obstetrícia”, de Jorge Rezende, também colaborou com capítulos para “Enciclopédia Médica Brasileira” e para publicações editadas no exterior, como o tratado de Hans Halbe, ou outros publicados em Genebra, Stutgard e Perugia. João Gomes da Silveira produziu mais de 130 artigos científicos em periódicos nacionais, cinco em revistas estrangeiras, além de muitos trabalhos de divulgação científica e das teses defendidas em concursos. Muitas foram suas viagens para participar de cursos e de congressos de ginecologia ou de seu ensino, sobretudo na Europa (27 vezes). Participante ativo de sociedades médicas e na Saúde Pública, foi presidente da Sociedade de Cirurgia do Rio Grande do Sul, da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do RGS, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia AMRIGS e da Federação das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASCO). Idealizou e coordenou o Curso Continuado de Cancerologia aplicada à Ginecologia, da Secretaria da Saúde do Estado. Por sua destacada atuação na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, foi agraciado com o título de Irmão Protetor.

Afora a medicina, teve Intensa atividade intelectual, que se iniciou cedo, em Santa Maria, escrevendo poesias e trabalhando no jornal Sul-Brasil. Aos 16 anos de idade, publicou “Pompeia Ressurgida”, livro de poesias, pela Editora da Livraria do Globo. Paralelamente ao curso médico, manteve seu trabalho na imprensa, como revisor, repórter, redator e, por fim, secretário de redação do “Diário de Notícias”, cargo que deixou ao concluir a Faculdade. Em 1946, publicou o romance “Uma Experiência de Amor”, pela Editora Globo. Pela mesma editora, foi um dos principais tradutores da monumental “Comédia Humana”, de Balzac, sendo responsável, entre outras, pelas traduções de “Tio Goriot” e de “Eugénie Grandet”. Como ente político, aos 17 anos, participou da Revolução de Trinta, fazendo parte das tropas de Flores da Cunha. Na década de cinquenta teve alguma atividade político-partidária e foi presidente do Diretório Estadual do Partido Socialista Brasileiro.

Em 1936, a 20 de julho, casou com Cely Tavares Py, filha do Prof. Aurélio de Lima Py, Catedrático de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Porto Alegre, e de Celina Piegas Tavares. O casal teve quatro filhos: o arquiteto Roberto Py Gomes da Silveira, o médico Gustavo Py Gomes da Silveira, o aeronauta Eduardo Py Gomes da Silveira e o advogado Ricardo Py Gomes da Silveira. Gustavo seguiu seus passos e veio a ser membro da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, que veio a presidir. Além das funções docentes e da clínica privada, encontrava tempo para outras atividades. Suas horas de lazer eram ocupadas com leitura ou com cuidados de agricultor, em que se dedicava ao cultivo de tomates-cereja e de rúcula.

O Professor João Gomes da Silveira faleceu no dia 10 de maio de 1989, aos 76 anos de idade, em Porto Alegre. Até o dia 9 de abril, esteve em plena atividade, atendendo sua clínica, coordenando o ambulatório de mastologia no Hospital da PUC, ensinando e pesquisando, sempre direcionado para o futuro e os progressos da sua especialidade. Como disse o Prof. Pedro Luiz Costa, “a Ginecologia do Rio Grande do Sul perde seu maior Ginecologista e o maior incentivador de jovens para a especialidade”. Foi sepultado no Cemitério da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.

Sua atuação científica originou o “I Encontro de Ex-Alunos do Prof. João Gomes da Silveira”, coordenado pelo Prof. Álvaro Petracco, em 1983. Em 1990, ocorreu o IV Encontro, o primeiro após a morte do Professor, com a presença do Dr. Andrew Schally, Prêmio Nobel de Medicina, que fez questão de comparecer ao evento como homenagem póstuma ao amigo.