Filho de Alcides Flores Soares e de Maria José Tavares Flores Soares, nasceu em Porto Alegre, no dia 30 de março de 1906, encaminhando seus estudos para o aprendizado da difícil arte da medicina. Em 1929, concluiu seu Curso Médico em nossa velha e querida Escola de Medicina da UFRGS, ardilosamente morta e vivissecada por alguns de seus diretos filhos. Em minha juventude, Flores Soares, juntamente com o saudoso prof. Guerra Blesmann, foram os primeiros que me ensinaram a amar e respeitar o antigo casarão, que sediou a Faculdade de Medicina, referencial pleno de nossas vidas médicas, hoje deteriorado pelo abandono, entregue às mãos de administradores historicamente não habilitados a sê-los.
A partir do momento em que teve seu diploma nas mãos, José teve o dom de vestir os dois hábitos dos quais nunca mais se desfaria: o imaculado avental de Hipócrates na lide diária com os doentes e a toga de tribuno em defesa dos ideais e metas da classe médica. Em novembro 1932, casou com a srª. Margot Moeller, filha de tradicional família de comerciantes de Porto Alegre, falecida no ano passado. Deixou do casamento 5 filhos, dos quais, o mais jovem, justamente aquele que leva seu nome, segue seus passos na carreira médica.
No exercício da medicina, Flores Soares galgou os mais variados e enobrecedores escalões da profissão, quer na Santa Casa, quer na Escola de Medicina, quer na política classista, da qual foi um dos nossos grandes batalhadores. Recém formado, embrenhou-se logo pelos caminhos que jamais abandonaria, ou seja, a perseguição constante de seu amplo ideário médico. Em 1930, assume o cargo de Adjunto da 2ª Enfermaria da Santa Casa, serviço do inesquecível prof. Thomas Mariante, luminar de nossa medicina, a quem era ligado por laços familiares. Homem irrequieto e batalhador incansável, a partir daí não mais cessa suas atividades, as quais terminarão por levá-lo, no momento exato, à Direção máxima de nossa medicina: a Presidência da Associação Médica Brasileira. Rememorando o currículo deste homem que tão bem soube exercer as funções de clínico geral e médico de família, meio século antes desta atividade surgir como especialidade médica, descoberta atual dos gerenciadores do moderno ensino médico, destacaríamos, com orgulho e carinho de primo e afilhado, alguns dos passos mais significativos de sua produtiva caminhada ao longo da vida.
Vamos encontrá-lo em 1932 como Adjunto do Diretor de Clínica Médica do Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência, período áureo desse nosocômio. Com a transbordante energia de sua juventude, assume, neste mesmo ano, o cargo de Secretário de Redação dos Arquivos Rio-grandenses de Medicina.
No Ensino Médico, seu percurso não foi menos ascendente. Em 1933, torna-se Assistente Voluntário da Primeira Cadeira de Clínica Médica e, em 1934, é elevado ao cargo de Assistente. Em 1935, assume a chefia desta mesma Cadeira de Clínica Médica de nossa Escola de Medicina, considerada na época, a segunda Faculdade em qualidade de ensino Médico no País. (Como decaímos desde então….).
O ano de 1949 lhe traz profundas emoções: por unanimidade, recebe o título de Irmão da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Os fortes vínculos religiosos de sua família e a excelente qualidade social do seu trabalho são publicamente admitidos através do reconhecimento de seu labor e de sua conduta. Ser Irmão simboliza a saga familiar, profundamente ligada à religião.
O ano de 1951 é profícuo na vida de Flores Soares: a intensa e sóbria atividade despendida o leva, em 27 de outubro daquele ano, juntamente com um grupo de amigos idealistas, a fundar a nossa AMRIGS. No mesmo ano lançam-se as pedras fundamentais da Sociedade Mater dos médicos de nosso país, a AMB, e aqui também, o incansável pelejador surge como um de seus sócios-fundadores. Se não bastasse ver vicejar neste ano estas duas importantes associações profissionais, às quais dedicou, nas suas estruturações, grande parte de seu tempo e de seu esforço, torna-se o primeiro Presidente da Sociedade de Medicina Interna do Rio Grande do Sul.
Homem de aparência tranquila, ponderado em suas atitudes, mas de espírito ágil e insatisfeito com suas vitórias, transforma-se em soberbo tribuno, porta-voz oficioso dos médicos rio-grandenses nas décadas de 30 a 60. Em sua firme ascensão no âmbito médico, assume, em 1954, a Presidência da Sociedade de Medicina de Porto Alegre.
Unindo-se a um seleto grupo de colegas, vários deles ainda em plena atividade, estruturam e fundam o Conselho Regional de Medicina, entidade que veio a presidir no biênio 1957–1958 e da qual, orgulhosamente, recebe a inscrição de número 1 em sua carteira.
Lutador incansável pelos interesses da medicina sul-rio-grandense, vem a presidir a Associação Médica do Rio Grande do Sul por dois biênios, 1959–1961 e 1961–1963. Firmava-se nossa Associação como resultado do trabalho desprendido e amoroso de seus primeiros diretores.
Como pináculo de sua luta pelos direitos médicos, é eleito e preside o órgão máximo da Medicina Nacional, a AMB, no biênio 1963–1965, quando mais uma vez demonstra suas qualidades de político habilidoso e bem quisto. Em sua gestão na AMB, depara com séria crise no meio médico de seu Estado, sendo obrigado a constantes intervenções em busca da pacificação que sempre almejara, pois apenas assim a classe médica cresceria forte e consciente. Como decorrência de seu trabalho, gestiona e atinge eleger Sebastião de Almeida Prado Sampaio, Catedrático de Dermatologia da USP, como seu sucessor na AMB. Consegue, assim, dar à nossa entidade máxima, continuidade às suas ideias.
Clínico de reconhecido valor e grande lutador por uma honesta política classista, é agraciado com a Ordem do Mérito Médico do Brasil, honraria destinada a figuras ímpares da Medicina Nacional. No final da década de 1960, passa a integrar em carácter permanente o Conselho Federal de Medicina, cargo que ocupará durante os 10 últimos anos de sua produtiva vida. Entre 1970 e 1976, torna-se Delegado da AMB, representando-a nas Assembleias da Associação Médica Mundial. Entre outras atividades exercidas e honrarias recebidas, lembraríamos as de Sócio Benemérito de diversas entidades médicas, destacando em especial os títulos outorgados pela AMRIGS e AMB, associações profissionais que devem sua origem ao esforço permanente de médicos de atuação marcante e determinação quase obsessiva em busca de suas metas. Naquela época de criações e nascimentos, deparamos sempre com grupos de colegas dedicados e altruístas, batalhando na constante busca de seus ideais, na procura de uma classe unida e forte. Naqueles momentos em que novas ideias fervilhavam nos meios médicos, lá sempre encontramos o nome de José Luiz Flores Soares, luzindo com sua inteligência, habilidade e tenacidade incomuns.
Os homens parecem nascer com seus destinos talhados para o sucesso ou para a mediocridade. Flores Soares cumpriu, ao longo de sua existência, tudo aquilo a que se propusera. Encontramos hoje na AMRIGS, no CREMERS e na AMB a perpetuação de seu trabalho. Deste modo cumpriu o seu destino. Em 1º de fevereiro de 1977, a falência abrupta de seu coração retira-o do convívio de inúmeros amigos e do carinho de sua família.