Mario Alvarez Martins, nasceu e cresceu em Santana do Livramento, cidade justaposta à “Linha Divisória”, uma forma peculiar de delimitar dois países, pois essa suposta “linha” jamais foi vista ou reclamada. Outros meninos (guris), também moradores nas cercanias do descampado que mais tarde seria a Praça José Bonifácio, que como ele estudariam Medicina, por lá também passaram: Rubens Maciel, Mário Rangel Ballvé, Carlos Osório Lopes, Hugolino de Andrade e o autor destas linhas. Seu pai, Montecristo Martins, um respeitável comerciante. Formou-se em 1932. Voltou aos pagos, recém formado.
Logo que concluiu o curso ginasial, em sua cidade natal, deslocou-se para Porto Alegre, a fim de cursar os preparatórios para ingresso na vida universitária. Na capital gaúcha, encontrou e iniciou uma longa amizade com seus companheiros de estudos e tertúlias, que com ele compartilharam as “repúblicas” – casas onde residiam os estudantes menos abastados: Cyro Martins, Lino de Mello e Silva, Carlos Tetamanzzi e o poeta Mário Quintana. Todos jovens sonhadores na “flor da mocidade”, adolescentes entre 17 e 18 anos, que sonhavam com um futuro promissor. Lá pelos anos 1926-27, Mário, Cyro e Lino, entusiasmados com os livros de psiquiatria que surgiam na época, decidiram estudar medicina, já com a mira voltada para a psicanálise. Já como primeiro-anistas rondavam o São Pedro e furavam as aulas de psiquiatria do sexto ano, de Luiz Guedes.
Mário formou-se em 1933, tendo optado por receber seu diploma no gabinete do Diretor da Faculdade, o “velho Sarmento Leite”, como era carinhosamente chamado, junto com Cyro Martins, porque ambos enfrentavam dificuldades econômicas.
Teve que tentar a sorte no interior de Carazinho, num distrito chamado Boa Esperança – hoje Colorado. Lá trabalhou quatro anos, até retornar para Porto Alegre, após casar-se com a bageense Zaira Bitencourt, em 1936, sua companheira de estudos e de trabalho pelo resto de sua vida. No ano seguinte, 1937, houve mudança no governo. Com o avento do Estado Novo, foi nomeado interventor federal o General Daltro Filho, em substituição ao republicano José Antônio Flores da Cunha, que viu-se obrigado a exilar-se em Montevidéu. Ele revolucionou a Saúde Pública no Rio Grande: construiu um novo pavilhão na Santa Casa, que leva seu nome e nomeou Diretor do então Departamento de Higiene o sanitarista Bonifácio da Costa, que abriu concurso para todas as categorias de funcionalismo público – que antes eram nomeados por apadrinhamento político, inclusive a de médico sanitarista, criando e construindo postos e centros de saúde, que até hoje existem. Foi assim que começou a nascer o pioneiro da psicanálise no Rio Grande do Sul e um dos mais brilhantes psicanalistas do país e da América do Sul. Ao lado de Cyro Martins, Victor de Brito Velho e Luiz Ciúla, submeteu-se ao concurso realizado na Faculdade de Medicina, ante uma banca brilhante, digna de um concurso de Cátedra: Antônio Saint Pastous, Diretor da Faculdade de Medicina, Fábio de Castro, Professor Catedrático de Neurologia, e Celestino Prunes, titular interino da Cátedra de Medicina Legal. Os quatro foram aprovados e nomeados médicos psiquiatras do Hospital Psiquiátrico São Pedro. Foi, também, convidado para ser médico residente do Sanatório São José, onde passou a morar com sua família, durante dois anos.
Em 1942, teve início um nova e promissora fase de sua vida, que se concretizaria dois anos após. Tomou conhecimento de que, emBuenos Aires, havia um grande centro de formação analítica; para lá se deslocou incontinente, lá permaneceu cinco longos anos sob a incomparável orientação de Angel Garma e Celes Ernesto Cárcamano.
Ao retornar a Porto Alegre, em fevereiro de 1947, iniciou o exercício da psicanálise em nosso meio, retornando às suas atividades no Hospital São Pedro, onde criou um verdadeira e respeitável escola de psicanálise no Rio Grande do Sul, transformando a modesta e vetusta Divisão Pinel, transformando-a no maior centro de irradiação de ensino e pesquisa da psicanálise no Brasil. Para isso, contou com a colaboração de uma brilhante equipe de psicanalistas, tais como David Zimmermann, mais tarde seu substituto na liderança do grupo, Jaime José Lemmertz, Ernesto La Porta, Paulo Guedes, Roberto Pinto Ribeiro, Luiz Carlos Meneghini, Cyro Martins e Celestino Prunes, que o ajudaram a elevar o prestígio da psicanálise do Rio Grande a níveis de alta representatividade no cenário científico nacional e internacional.
Apesar de sua formação psicoanalística de escola, que o transformou num símbolo nacional da especialidade, além de ter sido o fundador e presidente da Sociedade Psicanalítica do Rio Grande do Sul, graças ao seu prestígio reconhecida pela Associação Psicanalítica Internacional, Mário Martins não deixou uma grande produção científica publicada em periódicos nacionais e internacionais. Essa não era sua área de preferência. Apesar disso, escreveu uma série de artigos e ensaios, principalmente na área da epilepsia.
Mas a maior homenagem que poderia ter recebido foi-lhe proporcionada por seus discípulos, ao considerá-lo patrono e darem o seu nome à Fundação Universitária de Psicanálise.
Mario Martins faleceu em 1985.