Pesquisar

Cadeira 50

Martim Gomes

Martim Gomes nasceu em Quaraí, RS, filho de José Coradino Gomes e de Maria Luiza de Souza Gomes, em 23 de novembro de 1884. Doutorou-se em Medicina, em 12 de dezembro de 1908 pela Faculdade de Medicina de Porto Alegre.

Martim Gomes casou-se aos 27 anos de idade, em 26 de junho de 1911, com Maria Corrêa Gomes. O casal teve dois filhos, nove netos e sete bisnetos. Em 28 de fevereiro de 1912 foi nomeado Major Cirurgião da 55ª Brigada de Infantaria da Guarda Nacional.

Exerceu a atividade de cirurgião geral no interior do Estado do Rio Grande do Sul, até 1914, quando viajou para França e realizou, por dois anos, estágio no Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Laribosière.

Em 1917, tendo retornado ao Brasil, realizou concurso e foi nomeado Professor Substituto da Décima Seção na Cadeira de Clínica Obstétrica e Ginecológica, da Faculdade de Medicina de Porto Alegre.

O Governo Provisório do Estado nomeou-o, em 1931, Membro do Conselho Técnico da Faculdade de Medicina. Em 1941, foi Reitor Interino da Universidade do Rio Grande do Sul, com raro brilho. Em 1954, em 30 de novembro, aposentou-se como professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Rio Grande do Sul.

Em 1960, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, através de seu Reitor, Eliseu Paglioli, em ofício datado de 05 de março, outorgou-lhe o título de Professor Emérito desta universidade. Em 1974, o professor Arthur Mickelberg, Mestre do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, conferiu-lhe, em nome desta entidade, o título de Membro Emérito.

Martim Gomes faleceu em 1978, aos 94 anos de idade.

Com o desaparecimento de Martim Gomes, aos 94 anos de idade, dos quais 57 dedicados à Medicina, perdeu a classe um de seus maiores valores. Não são só a Ciência Médica o perdeu, mas, também, as Letras e as Artes.

Criou-se Martim Gomes no seio de uma família devotada à vida austera e à espiritualidade. Revelou desde cedo seu pendor pela cultura humanista, pelas artes do desenho, da pintura e da música. Seu instrumento musical era a flauta e muitos de seus contemporâneos julgavam-no apto a dedicar-se à música, como instrumentista.

Transferiu-se para Porto Alegre, onde realizou seu curso secundário na Escola do Prof. Emílio Meier, na Praça da Matriz. Destacou-se como um estudioso de grande valor e com notável pendor para assuntos como: ciência, filosofia, literatura, música, desenho e pintura.

Naqueles tempos, como era de hábito, moravam os estudantes, advindos do interior do Estado, em casas que se chamavam “Repúblicas de Estudantes”. Francisco Medeiros de Albuquerque dirigia esta em que morou Martim Gomes, e nela moraram outros estudantes que também se notabilizaram na vida política, intelectual e científica brasileira. Colegas da época foram, por exemplo: Getúlio Vargas, Maurício Cardoso, Leopoldo Pires Porto, Adalberto Corrêa e outros.

Martim Gomes revelou-se estudante brilhante, com notas, de distinção. Praticava algum esporte como remo e ciclismo, mas não desfrutava das alegrias estudantis e das festas tão comuns nesta fase da juventude. Preferia permanecer em seu quarto, com livros abertos, lendo e estudando. Buscava, com sua curiosidade insaciável, aprender, meditar e conhecer. Frequentemente as luzes da manhã o encontravam fascinado pelo prazer do saber e pela esperança no futuro. Sua fama de aluno erudito, que foi gradualmente construindo, tornou-o conhecido pelos colegas, que passaram a procurá-lo para esclarecimentos. Martim Gomes lecionou Grego, Latim e Matemática aos seus contemporâneos, numa atividade didática que já mostrava o seu pendor pela educação. Esta atividade também proporcionava-lhe reforço financeiro para seu orçamento pessoal.

Como homem público, integrado ao seu meio social, deixou profunda impressão em polêmicas que enfrentou nos meios de divulgação da época. Foi considerado escritor e orador de raro brilho. Seu nome é eternizado em sala especial no hospital da terra em que nasceu.

Como médico, soube sempre demonstrar interesse e carinho no cuidado dos pacientes. O enfermo sempre foi para ele um ser humano. Procurou sempre o correto modo de interpretar as manifestações psíquicas correlacionando-as aos acontecimentos somáticos. Foi, portanto, fácil enveredar pela nova senda do conhecimento médico que se convencionou chamar de moléstias psicossomáticas.

Como professor, em contato com os alunos, sempre procurou orientá-los expondo os casos clínicos com exuberância de dados. Citava contribuições alheias e, a cada passo, introduzia sua valiosa contribuição pessoal. Como professor, soube ser médico prático, soube ser pesquisador e educador. Nunca lhe faltou entusiasmo e conhecimento pleno da matéria ensinada.

A defesa de tese do Dr. Martim Gomes para título de Doutor em Medicina foi um acontecimento no meio acadêmico. O assunto já mostrava a inclinação forte no sentido de avançar no estudo do insipiente conhecimento médico do psiquismo humano. Suas teorias sobre associações de ideias repercutiram no Brasil e fora dele. O famoso psicólogo francês, Jorges Dumas, em contato com o Professor Eliseu Paglioli, Reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, afirmou que os trabalhos de Martim Gomes sobre o assunto haviam modificado seu conceito sobre a associação de ideias. O professor Jorge Dumas era na época Presidente da Sorbone de Paris.

A vida do Professor Martim Gomes segue uma trajetória sempre crescente, somando e distribuindo experiências. Criou uma Escola de Clínica Ginecológica no Rio Grande do Sul, que se projetou em todo o Brasil.

Habilitou-se ao Curso Médico na Faculdade de Medicina de Porto Alegre, onde formou-se com brilho e louvor. Ao concluir o curso, defendeu tese de Doutorado, que repercutiu nos meios médicos e acadêmicos riograndenses, pela sua qualidade e pela alta capacidade de pesquisa demonstrada. Existe alguma divergência com respeito ao título desta tese: segundo alguns, seria Ensaio de uma Teoria sobre o Mecanismo Fisiológico da Associação das Ideias; segundo outros, o título seria Funções Psíquicas – Lei das Associações em Psicologia – Ensaio de uma Teoria de seu Mecanismo Fisiológico. Foi aprovada, sua tese, com distinção.

Sua vida profissional que se inicia no interior, como cirurgião geral, prolonga-se em estudos de aperfeiçoamento em centros europeus. Buscou dedicar-se a Ginecologia e Urologia como especialidade. Ambicionou, também, em seu retomo a este Estado, candidatar-se à Cadeira, a qual já se dedicara no Curso de Graduação da Faculdade de Medicina. Procurou aperfeiçoar sua vocação, pois, nascera não só para ser médico, mas, também, para ser professor.

Quando de sua estadia na França, meca do conhecimento médico da época, tornou-se um dos principais assistentes do Serviço de Urologia do Hospital Lariboisiére em Paris (Serviço do Prof. Marion), onde tornou-se 1º assistente. Ao retornar ao Brasil, foi surpreendido com a reforma do ensino e da estrutura das especialidades. Separaram-se as secções de Urologia e Ginecologia, juntando-se a esta última a Obstetrícia. Tal acontecimento não modificou sua atitude e inscreveu-se para o concurso de Professor Substituto na Cátedra de Ginecologia e Obstetrícia, da Faculdade de Medicina de Porto Alegre. Aprovado brilhantemente, foi nomeado e ingressou, finalmente, no magistério universitário. Mais tarde, a Cadeira de Clínica Ginecológica e Obstétrica fica vaga pela aposentadoria do Professor Serapião Mariante, e Martim Gomes, como era de lei, galgou a cátedra. Nesta época, definiu-se sua futura dedicação médica e pedagógica, pois, as circunstâncias o levaram a abandonar a Urologia e dedicar-se a Ginecologia e Obstetrícia, nas quais tanto se destacou. Sua tese para o concurso a que se submeteu foi Uma Forma Dinâmica de Elevação do Útero.

Foi agraciado, pouco tempo depois, com o título de Irmão da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia. Foi membro do Centro de Estudos Cardoso Fontes. Foi fundador da Sociedade de Medicina de Porto Alegre e da Sociedade de Ginecologia do Rio Grande do Sul. Foi, também, membro convidado da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia de Buenos Aires.

Percebe-se que a atuação do professor rio-grandense, Martim Gomes, projetou-se em vários campos da medicina. A partir de sua atuação como ginecologista e obstetra, Martim Gomes foi percebendo, com sua argúcia de cientista, as implicações dos mecanismos psicológicos nas enfermidades que estudava e tratava. Embrenhou-se no estudo da nascente psicologia médica e medicina psicossomática, das quais se tornou pioneiro, através de uma série enorme de trabalhos. Não abandonou, no entanto, a sua especialidade inicial, sendo hoje considerado o introdutor, no Brasil, da citologia ginecológica. Neste campo, sua contribuição mais marcante foi a prática do diagnóstico detalhado antes das intervenções cirúrgicas.

Contrariando as tendências da época, estimulou o sentido conservador das técnicas cirúrgicas, tais como a ablação do útero, conservando os ovários para evitar as consequências invalidantes da castração para a mulher. Foi introdutor da técnica cirúrgica para o tratamento do câncer genital feminino, com o esvaziamento inguinal linfático associado. É técnica adotada até hoje para tratamento do câncer ginecológico.

Seus estudos pioneiros sobre a psiquê humana estão documentados em seus inumeráveis trabalhos, publicados em revistas médicas, ministrados em aulas e congressos no país e no exterior.

Sua incursão pela literatura resultou, dentre outros, em dois livros: A Flor da Tuna e As Loucuras do Dr. Mingote. A crítica literária da época (Plínio Barretto e outros) considerou as obras de grande densidade e de elevado conteúdo psicológico e social. Publicou no Correio do Povo, às terças-feiras, por anos, uma coluna de crônicas que denominava Proza das Terças.

Membro da Academia Sul-rio-grandense de Letras, dissertou, entre outras, sobre a obra de Alcides Maia, em um estilo de peregrina beleza de conteúdo regionalista. Em concurso para a Obra de Educação para Adultos, do Ministério de Educação e Cultura, apresentou História da Literatura Oral Sul-rio-grandense e sua influência na literatura e no caráter do Brasileiro.