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A MAMA VELEJADORA – Histórias de um mastologista – Prof. Dr. Carlos Henrique Menke

Texto do Acadêmico Waldomiro Carlos Manfroi


Conforme ia lendo o texto, não foram necessárias muitas páginas para entender que estava desfrutando as memórias do humanista: Prof. Carlos Henrique Menke. Pois, um humanista é: generoso e valoriza o ser humano e a condição humana acima de tudo. Para tanto, bem na abertura do documento, cita como ATORES DE SUAS MEMÓRIAS, uma série de professores que o precederam. E, ao longo do texto destaca o quanto eles foram importantes no seu desenvolvimento de médico mastologista e professor.

Outros predicados que identificam um humanista são: a compaixão e a preocupação para com seus pares. E essas caraterísticas são encontradas em inúmeros momentos do texto, mas um chama a atenção de modo especial. A dedicação hipocrática que prestou ao atender uma grávida que já havia perdido três filhos ainda em formação. Tal fora o reconhecimento da nova mãe que dera o nome Carlos Menque ao filho que nascera a termo e sadio. E aproveita o momento para dar vez e voz às mulheres que marcaram época para o avanço da mastologia e a inserção das mesmas num novo contexto social. A primeira referência sobre essas desbravadoras é encontrada na página vinte e quatro, quando descreve um momento marcante da sua especialidade. “Carol Doda, até então uma obscura dançarina da pequena boate Condor, em São Francisco da Califórnia (EUA), estremecera o mundo, em junho de 1964, ao executar o primeiro topless de que se tem notícia”. E logo abaixo, mais uma citação que marcou época na evolução social da mulher: “Foi nessa época, em setembro de 1968, que aconteceu o famoso episódio da Queima de Sutiãs, marco do movimento feminista. Na ocasião, centenas de mulheres se reuniram em frente ao local do concurso de Miss EUA, em Atlantic City e jogaram num tonel, não só os sutiãs, mas também outros adereços de embelezamento”.

Na página quarenta e nove, encontramos outro ato de generosidade do Prof. Menke. Com o título CÁSSIA KISS: A MUSA DA PREVENÇÃO, mais uma ele faz merecida homenagem à outra mulher que marcou história na sua especialidade: “No final da década, com a difusão da mamografia e a conscientização do público feminino, as campanhas de prevenção começaram a se tornar frequentes e uma delas ganhou notoriedade, no projeto do Ministério da Saúde e da Sociedade Brasileira de Mastologia. Era uma campanha promovia a prevenção do câncer de mama e que tinha como modelo a atriz Cássia Kiss. Por meio de imagens vivas a atriz recomendava a prática do autoexame, desnudando as suas mamas na TV. Sua atitude para a época, foi arrojada e, além do mais, não cobrou cachê. Ficou como a musa da prevenção”. E na página cento e dezessete, sob o título, as mamas de Angelina, Prof. Menke aproveita para caracterizar mais uma fase evolutiva do saber sobre o câncer de mama, o da mastectomia preventiva, com o destaque: “Quando em 2013 uma das mulheres mais bonitas e célebres do mundo revelou que se submetera a uma cirurgia de retirada das duas mamas para prevenir o câncer, houve uma comoção ao redor do planeta. Subitamente as mulheres de novo se viram confrontadas com a ameaça maligna do órgão que elas mais valorizavam: a mama. A conhecida pulsão freudiana Eros e Thanatos, da vida e da morte, de uma parte de seu corpo que causa orgulho e prazer, mas que também pode matar – voltou a assombrar o universo feminino. Como pode essa diva do cinema, modelo de beleza e sensualidade, sacrificar os símbolos de sua condição de fêmea? E ela corajosamente o fez e não só o fez como publicou a sua decisão radical, impactando a todos”.,

Sobre seu desenvolvimento técnico e científico, o texto registra a rica jornada que o Prof. Menke percorreu. Começa com sua formatura em 1965, na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FAMED/UFRGS). Seguem-se os estágios de Residência Médica, na enfermaria da Santa Casa de Porto Alegre, então área de ensino da Cátedra de Ginecologia e Obstetrícia, e vários cursos de especialização, no Brasil e no estrangeiro. Vem a seguir, sua inserção como docente na faculdade em que se formou e, finalmente, a obtenção do título de Doutor em Ciências Médicas. Desde então, passa a ocupar diversos cargos administrativos, dentre eles o de Chefe do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. E para completar sua exitosa jornada, cria, em 1996, o Serviço de Mastologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Em relação a sua preocupação com desenvolvimento de seus pares, na página cinquenta e um encontramos dois registros que caracterizam mais uma vez o que é ser um bom professor: Em 1991, é escolhido como paraninfo de uma das turmas de formandos e ungido com o título de Professor Convidado da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nacional de Rosário, Argentina.

Outra particularidade que o caracteriza o Prof. Menke como sendo um humanista é sua inserção à arte na mesma dimensão que o faz com a ciência. Essa vinculação aparece desde os tempos de acadêmico de medicina quando cantou, por muitos anos, no Coral da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E, passou a cultivar, desde então, todos os gêneros de música da sua época. Nos dados biográficos desfilam os grandes autores da música clássica, os da música popular brasileira, os roqueiros e cantores da música caipira de então, com destaque especial para a dupla Tonico e Tinoco. E demonstra bem cedo, também interesse por outro capítulo das artes: o das letras. E começa cedo. Sob o pseudônimo de João Grande e com o título Cinegética, publica crônica semanal, de 1965 a 1984 no Jornal Correio do Povo. E desde então, publicou as seguintes obras:

História de João Grande. Editora AGE, Porto Alegre, 2012. DGO – 50 anos. Editora da UFRGS, Porto Alegre, 2018 (em colaboração com Arnaldo Kunde, Fernando Freitas, Heitor Hentchel e Waldemar Rivoire). Como membro da comissão do Livro 30 Anos da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina, e autor publicou o capítulo: PRIMÓRDIOS. Editora Metamorfose, Porto Alegre, 2020, Saúde tem História II Narrativas no Centro Histórico Cultural, Santa Casa de Porto Alegre. Org. Leonor Baptista Schwartsmann, João Carlos Goldani, Vera Lúcia Maciel Barroso. ISCMPA, Porto Alegre, 2021. A Mama Velejadora (The Sailling Brest). Editora AGE, Porto Alegre, 2021.

Como bom amante das artes, cultivou sua outra grande paixão: o cinema. E se torna um expert no gênero Western. Vejamos então o que o Prof. Menke nos diz sobre esse capítulo da arte “Em toda minha vida, tive enorme admiração pelo faroeste americano e, como não existia a televisão, na minha fantasia de adolescente: eu cavalgava junto com aqueles cowboys. Todos os que têm hoje mais de 50 anos foram influenciados por este gênero. Em 2014, após peregrinar ao Monument Valley, na fronteira do Arizona com Utah (ver anexo), comecei a escrever e a fazer apresentações públicas sobre o cinema western. Relembrei os filmes clássicos e louvei John Ford, Sérgio Leone, San Peckinpah e Clint Eastwood, os quais erigiram monumentos de beleza que a humanidade toda vai ficar devendo”.

Por ser um ente solidário e multiplicador, ao se aposentar na atividade de docente regular da Faculdade de Medicina da UFRGS, em 2011, Prof. Menke é eleito Membro Titular da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina. Nos novos desafios, passa a colaborar com seus pares em outras iniciativas inovadoras, como a que inseria os alunos de Pós-graduação de sua área nas atividades mensais da academia. E, depois de eleito presidente da referida entidade continua apoiando o inovador projeto Encontros Literários, coordenado pelo acadêmico Rogério Xavier e implementa o capítulo Novos Talentos e contribui, de modo decisivo, com a comissão por ele instituída para a publicação do Livro 30 Anos da Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina. Em maio de 2021, ao findar seu segundo mandato, é honrado com o convite de participar como Irmão da Irmandade Santa Casa de Porto Alegre.

Em resumo: Como um homem que teve a felicidade de vencer os desafios que encontrou em sua profícua jornada, Prof. Menke reverencia os que lhe deram suporte na longa travessia: pai, mãe, esposa, filhos e netos são lembrados com carinho.

Por fim, cabe uma menção especial à escolha do enigmático título da obra: A Mama Velejadora. Trata-se de mais uma belíssima passagem que caracteriza o quanto Prof. Menke estava sempre em contato com o mundo que o cercava. Fosse na sua atividade médica/docente ou fosse na sua vinculação com as artes, estava ali de forma integral. Ao encontrar numa foto a relação de um pôr de sol da sua amada Porto Alegre com a mama da sua dedicação profissional nessa visível, a inscreve num concurso internacional de fotografia. E assim sua terra natal viaja nas asas da Mama Velejadora pelo mundo, em forma de bela metáfora.

O leitor que tiver o prazer de ler esta bela biografia do Prof. Carlos Henrique Menke, vai acompanhar a evolução da prevenção e tratamento do câncer da mama, a evolução da ciência da sua especialidade e, sobretudo, em que mundo ele viveu e como dele participou e contribuiu.