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Câncer da boca: aspectos clínicos e prevenção

Os cânceres da boca, compreendendo lábio, língua, gengivas, assoalho da boca e palato, representam, coletivamente, a 16ª neoplasia mais comum em todo o mundo, com quase 355.000 casos novos e mais 177.000 mortes estimadas, em 2018 [1]. Os tumores podem se localizar no vermelhão labial, a transição entre a pele e a mucosa oral, ou em toda a mucosa bucal: língua, gengivas, bochechas, assoalho e palato [2]. Tem origem principalmente a partir das células epiteliais de revestimento e quase 90% são do tipo carcinoma de células escamosas (também denominado espinocelular ou carcinoma epidermóide).

Geralmente, estes tumores epiteliais iniciam com a leucoplasia, mancha seca, esbranquiçada, com escamas aderentes, quando no lábio; e úmida, macerada pela saliva, quando localizada na mucosa da cavidade oral. Com o passar do tempo (meses ou anos) e a progressiva e desordenada multiplicação das células cancerosas, esta lesão costuma apresentar uma base endurecida, infiltrada, que evolui para a ulceração, com fundo e bordas irregulares. Na maioria das vezes, essa “ferida” é quase assintomática, fato que pode favorecer uma não busca por atendimento médico e retardar o seu diagnóstico correto. Resumindo, qualquer ferida crônica da boca deve ser avaliada por um profissional. Isto porque um diagnóstico e conduta precoces permitem altos níveis de cura, fato que não acontece com lesões avançadas, negligenciadas, que permitem o aparecimento de metástases, disseminação e, em certos casos, o óbito.

Os níveis de cura e sobrevivência global variam de acordo com a região geográfica, país, topografia e população; em países desenvolvidos, como na Inglaterra, por exemplo, estima-se que 60% dos pacientes sobrevivam três anos após o diagnóstico.

O prognóstico é muitas vezes pior nos países em desenvolvimento, com situação sócio-econômica comprometida e hábitos de higiene oral inadequados. Os cânceres da boca podem ser evitáveis através da redução da exposição aos fatores de risco de cada tipo, ou pela triagem e diagnóstico de distúrbios orais potencialmente malignos. [2] Uma mudança substancial nos padrões e tendências do câncer da boca foram relatados em países de alta renda nos últimos 30 anos, impulsionados por uma prevalência na mudança e na distribuição dos principais fatores de risco [3].

Dentro destes fatores, além de ter cuidados adequados com a higiene bucal e dentária , na prevenção do câncer da boca, deve ser evitado o consumo abusivo de bebidas alcoolicas, pois ele está bastante associado ao surgimento do câncer oral e possui forte interação com o tabagismo no mecanismo de carcinogênese [4].

Existem outros fatores de risco para alguns subtipos específicos de carcinomas epidermóides. O Papilomavírus Humano (HPV) de alto risco tem sido associado a estas neoplasias em regiões orofaríngeas (incluindo base da língua, amígdala lingual e

palato mole), em algumas subpopulações de alguns países desenvolvidos (principalmente homens, com idades mais jovens, de origem européia, possuidores de situação sócio-econômica mais elevada), enquanto que os cânceres de lábio (principalmente o inferior, pela sua posição anatômica) estão fortemente associados à agressão persistente da radiação ultravioleta (RUV) ocasionada pela exposição crônica à luz solar [5,6] da mesma forma como acontece no restante do tegumento, que pode estar associado ao fotodano e à carcinogênese.

Bem mais raro, mas nem por isso carente de importância, principalmente por sua potencial agressividade e risco de disseminação, é o Melanoma oral. Comparece com somente 1 a 2% de todas as neoplasias malignas da boca, incidindo predominantemente entre a 4ª e 7ª décadas da vida. Pode se apresentar como uma mancha marrom-escura irregular, na mucosa da boca, assintomática, com evolução lenta (meses ou anos), ou como uma lesão nodular com diferentes tons de marrom escuro, preto, cinza, vermelho, ou com áreas de despigmentação [7].  Pode haver ulceração. A etiologia, os fatores de risco e a fisiopatologia ainda são pouco compreendidos. O diagnóstico (quanto mais precoce, melhor) é feito através da análise de biópsia e o tratamento é basicamente cirúrgico [8].

REFERÊNCIAS

[1] Bray F, Ferlay J, Soerjomataram I, Siegel RL, Torre LA, Jemal A. Global cancer statistics 2018: GLOBOCAN estimates of incidence and mortality worldwide for 36 cancers in 185 countries. CA Cancer J Clin. 2018;68(6):394–424

[2] Sankaranarayanan R, Ramadas K, Amarasinghe H, Subramanian S, Johnson N. Oral Cancer: Prevention, Early Detection, and Treatment. In: Gelband H, Jha P, Sankaranarayanan R, Horton S, editors. Cancer: Disease Control Priorities, Third Edition (Volume 3) . Disponivel em:http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK343649/.

[3] Chaturvedi AK, Anderson WF, Lortet-Tieulent J, Curado MP, Ferlay J, Franceschi S,et al. Worldwide trends in incidence rates for oral cavity and oropharyngeal cancers. J Clin Oncol 2013;31(36):4550–9.

[4] Bagnardi V, Rota M, Botteri E, Tramacere I, Islami F, Fedirko V, et al. Alcohol consumption and site-specific cancer risk: a comprehensive dose-response metaanalysis. Br J Cancer 2015;112(3):580–93.

[5] Han AY, Kuan EC, Mallen-St Clair J, Alonso JE, Arshi A, St John MA. Epidemiology of Squamous Cell Carcinoma of the Lip in the United States: A Population-Based Cohort Analysis. JAMA. Otolaryngol Head Neck Surg 2016;142(12):1216–23.

[6] Rigel DS. Cutaneous ultraviolet exposure and its relationship to the development of skin cancer. J Am Acad Dermatol 2008;58(5):S129–32.

[7] Warszawik-Hendzel O, Słowińska M, Olszewska M, Rudnicka L. Melanoma of the oral cavity: pathogenesis, dermoscopy, clinical features, staging and management. J Dermatol Case Rep. 2014 Sep 30;8(3):60-6.

[8] Lambertini M, Patrizi A, Fanti PA, Melotti B, Caliceti U, Magnoni C, Misciali C, Baraldi C, Ravaioli GM, Dika E. Oral melanoma and other pigmentations: when to biopsy? J Eur Acad Dermatol Venereol. 2018,32 (2):209-214.

Artigo escrito pelo dermatologista e Acadêmico Lúcio Bakos.